O blog do Leandro Alves

As pessoas são todas umas bisbilhoteiras.  Falam dos vizinhos, falam dos amigos pelas costas, espiam a vida dos outros.  O jornaleiro, o dono da padaria, o cobrador do ônibus, o marido da vizinha, o professor do colégio — ninguém escapa deste prazer humano de falar da vida dos outros.  Pode ser falar bem, mas também falar mal. Algumas pessoas são como eu, transformam tudo em crônicas.

Leandro Alves

Amizade virtual existe?

 

 

 

 

 

Amizade virtual existe?

existe?Surgiu uma pergunta hoje: amizade virtual existe?

Muita gente diz que não. O outro que conversa com a gente pela tela do celular é apenas uma imagem, os sentimentos são apenas uma projeção, o carinho, as gargalhadas que damos juntos, todas as horas que passamos compartilhando a vida com os outros. Nada disso é de verdade.

No restaurante, na fila do banco, da fila para a sala de cinema, na praça, no bar, nas cafeterias, nas sorveterias. Em todo lugar, há sempre uma pessoa conversando com um outro que está presente apenas pela tela do celular.

Há alguns anos, as pessoas matavam o tédio conversando uma com o passageiro do lado no ônibus. Davam aquela gargalhada mais gostosa, compartilhavam sentimentos, curtiam a companhia um do outro e às vezes nunca mais se viam.

A vida era ao vivo e a cores. Não havia outra opção.

Hoje tudo mudou. Antes, você ia num show de música e poderia conhecer alguém bem legal que também estivesse ali sozinho; hoje, as pessoas abrem uma chamada de vídeo no meio do show e curtem com alguém que não está ali presente.

Porém, alguns encontros podem acontecer de maneira inusitada. Alguém pode, por exemplo, ler um comentário num perfil de um amigo comum e sentir vontade de mandar um convite para te seguir nas redes sociais.

Você pode sentir uma alegria imensa em compartilhar a vida com gente que conheceu num curso online de inglês, numa reunião virtual do trabalho, num fórum de debate político, numa live. Dali por diante, fazer chamadas de vídeo frequente com a pessoa para falar da vida.

A amizade virtual lembra a amizade que as pessoas tinham por cartas. Afinal, na internet os amigos passam a maior parte do tempo escrevendo uns para os outros.

Cartas antigas hoje em dia ficaram famosas e se transformaram em livros: correspondência entre Mário de Andrade e Fernando Sabino, Fernando Sabino e Clarice Lispector, Caio Fernando Abreu e seus inúmeros amigos pelo mundo, Jorge Amado e José Saramago.

Quem julga a amizade virtual subestima a capacidade humana de criar novos afetos, novas formas de viver, de aproveitar a vida, de gostar.

Um amigo virtual pode fazer uma chamada de vídeo quando sua mãe está doente no hospital, mandar mensagens quando você faz um luto de um amigo que morreu, comemorar quando você trocou de emprego, quando está namorando de novo depois de muito tempo.

Durante uma chamada de vídeo, você pode pegar seu balde de pipocas e o amigo pegar o dele, seu pedaço de pizza e o amigo pegar o dele, sua cerveja e seu tira- gosto e o amigo pegar o dele, pode buscar seu café e o amigo o dele.

A rigor, para uma amizade acontecer entre duas pessoas só precisa que uma se sinta alegre na companhia da outra. Por ser numa sessão de cinema, numa chamada de vídeo pelo celular, numa mesa de bar. Não importa.

Quem sabe o inesperado faça uma surpresa? O amigo ou amiga durante um congresso presencial curto na sua cidade. Um dia para o abraço, para conversa olho no olho, para almoçarem juntos.

Bom, a amizade virtual pode ser feliz desde que você não tire os olhos da vida ao vivo e a cores. Desde que tire um tempo também para tomar aquele chope com os amigos de corpo presente, ir ao boliche, festas ou o que mais que você goste. Claro, sem ficar olhando o celular a cada cinco minutos. A vida não precisa ser ou isto ou aquilo o tempo todo.

 

Crédito da imagem: Pixabay

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Respostas de 2

  1. É como VC falou, amigo: _ Surpresas podem acontecer….
    Em um mundo cada vez mais virtual, há sempre espaço p um abraço carinhoso!
    Muito boa a crônica, amigo!

    1. Genilson, conheci uma amiga na época do Orkut. Um dia ela veio para um congresso aqui em BH, ligou para minha casa, a gente passou o dia juntos. Quando a família dela soube que deu tudo certo, ficou uma amizade geral.

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Foto: Gustavo Noronha

Leandro Alves
Muito prazer!

Mineiro, de Belo Horizonte, cronista, formado em Letras pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, a PUC Minas.  Comecei a escrever crônicas postadas nas minhas redes sociais, muita gente gostou e eu continuei. Atualmente, cronista do jornal Porta Voz de Venda Nova. O jornal é impresso, mas esporadicamente também é distribuído online.

Participei do livro “Escrevendo com as emoções”, editora Leonella, sob a curadoria da escritora Márcia Denser.  De 2015 até maio de 2023, participei do Estúdio de Criação Literária, nos formatos presencial e online.

Depois de ler “O padeiro”, crônica de Rubem Braga, e “Flerte”, de Carlinhos de Oliveira, decidi que o que mais desejo fazer nada vida é ser cronista.

Acredito que todos nós, sem exceção, todo dia que saímos de casa, queiramos nós ou não, participamos de um grande filme mudo chamado vida e que tem sempre alguém bisbilhotando tudo o que a gente faz e falando da gente pelas costas. Neste caso, alguns são como eu e escrevem crônicas.  Muito prazer!

Curadoria Márcia Denser