O blog do Leandro Alves

As pessoas são todas umas bisbilhoteiras.  Falam dos vizinhos, falam dos amigos pelas costas, espiam a vida dos outros.  O jornaleiro, o dono da padaria, o cobrador do ônibus, o marido da vizinha, o professor do colégio — ninguém escapa deste prazer humano de falar da vida dos outros.  Pode ser falar bem, mas também falar mal. Algumas pessoas são como eu, transformam tudo em crônicas.

Leandro Alves

Boa tarde

 

 

 

Boa tarde

por Leandro Alves

Como você reage quando alguém te para na rua para te desejar bom dia ou boa tarde? Você olha a pessoa com estranhamento? Acha que o desconhecido vai te pedir dinheiro? Pensa que vai te entregar um jornal da igreja? Ou quem sabe interromper seu dia para ficar reclamando da vida?

Certa tarde eu ia ao centro de ônibus quando vi uma cena que me chamou a atenção. Um menino, de mais ou menos uns dezessete anos, olhando de fora, chegava na janela para dizer “boa tarde” para quem passava na rua e tudo a troco de nada.

Aguçou minha curiosidade de cronista. Duas meninas, passando na rua,  mais ou menos da idade dele, o ônibus estava na Avenida Bias Fortes, responderam com uma voz que mal saía. Não com má vontade, mas desacostumadas mesmo com gentilezas do cotidiano. Depois vi que os homens simples, pobres, aqueles que não tinham dinheiro para boas roupas ou sequer para comer nas lanchonetes do centro, eram os que mais respondiam.

Guardadores de carros, porteiros, vendedores de água mineral, manobristas, faxineiros. Gente assim nunca é insensível a um bom dia de desconhecidos.

Fora os velhos, como o rapaz do ônibus deve ter reparado, mais acostumados ao mundo analógico do que ao digital, cumprimentavam o menino sem receios.

Reparei que o que desejava boa tarde da janela do lotação estava alegre, tinha um brilho nos olhos diferentes, viço, paz na alma. Não queria incomodar ninguém. Não pedia nada em troca.

O que sei é que este momento em que paramos para desejar um bom dia ou uma boa tarde para um desconhecido, mesmo que soe um pouco estranho num primeiro momento, ainda que o outro nem queira responder, é um momento raro de conexão com a vida e pode até mesmo impedir alguém que iria tirar sua vida naquele dia. Palavras nunca são vãs. Palavras nos colocam em contato com a poesia do cotidiano.

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Respostas de 2

  1. Gentileza gera gentileza!
    Sempre bom sermos receptivos a um bom dia ou boa tarde de um estranho/a!
    Obrigado amigo por esta crônica que é um afago na alma!

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Foto: Gustavo Noronha

Leandro Alves
Muito prazer!

Mineiro, de Belo Horizonte, cronista, formado em Letras pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, a PUC Minas.  Comecei a escrever crônicas postadas nas minhas redes sociais, muita gente gostou e eu continuei. Atualmente, cronista do jornal Porta Voz de Venda Nova. O jornal é impresso, mas esporadicamente também é distribuído online.

Participei do livro “Escrevendo com as emoções”, editora Leonella, sob a curadoria da escritora Márcia Denser.  De 2015 até maio de 2023, participei do Estúdio de Criação Literária, nos formatos presencial e online.

Depois de ler “O padeiro”, crônica de Rubem Braga, e “Flerte”, de Carlinhos de Oliveira, decidi que o que mais desejo fazer nada vida é ser cronista.

Acredito que todos nós, sem exceção, todo dia que saímos de casa, queiramos nós ou não, participamos de um grande filme mudo chamado vida e que tem sempre alguém bisbilhotando tudo o que a gente faz e falando da gente pelas costas. Neste caso, alguns são como eu e escrevem crônicas.  Muito prazer!

Curadoria Márcia Denser