O blog do Leandro Alves

As pessoas são todas umas bisbilhoteiras.  Falam dos vizinhos, falam dos amigos pelas costas, espiam a vida dos outros.  O jornaleiro, o dono da padaria, o cobrador do ônibus, o marido da vizinha, o professor do colégio — ninguém escapa deste prazer humano de falar da vida dos outros.  Pode ser falar bem, mas também falar mal. Algumas pessoas são como eu, transformam tudo em crônicas.

Leandro Alves

Poema extraído de um filme italiano

 

 

Leandro Alves: Poema extraído de um filme italiano

Alguns filmes que passam no cinema não são um convite, mas uma intimação. Daqueles que parecem terem sido feitos para mim, sob medida, como se fossem uma biografia não autorizada minha.

Foi o que aconteceu esta semana com o filme “Il primo giorno della vita via”, “O primeiro dia da minha vida”, em português, de um diretor chamado Paolo Genovese.

O filme é assim: quatro pessoas estão de saco cheio da vida e resolvem se matar. Uma mulher cadeirante, um palestrante motivacional, um garotinho YouTuber e uma dona de casa. Aí chega um homem misteiroso e pergunta: e se você pudesse depois de morto ver a vida continuando sem você? As pessoas que você amou, sua família, seus colegas de trabalho, os lugares onde você andava. Paro por aqui.

Aí percebi que os diálogos do filme são poesia pura. Notei que, um poeta atento, um artista que guardasse de cor as falas do filme, poderia juntar todas elas e compor um poema — mostrando que nas telas de cinema também vemos filmes cheios de poesia. Se o poeta tiver atenção, transforma tudo num poema.

Aí eu me lembrei de uma crônica que eu gosto muito intitulada “Poema desentranhado”, do Manuel Bandeira, num livro chamado “Os Reis Vagabundos, uma prosa impecável do poeta, pela editora do autor, selecionadas por ninguém mais ninguém menos que Rubem Braga, o príncipe do gênero — Manuel Bandeira compõe um poema tirado de um artigo de Augusto Frederico Schmidt .

Resolvi fazer o mesmo, mas com as falas do filme italiano que tanto me encantou esta semana.

Poema da vida

O simples fato de estar vivo às vezes te desgasta.
Algumas pessoas vão te amar e outras não.
Até mesmo os pais, que são pessoas muito importantes na sua vida, podem te dar um amor insuficiente, que no fundo te faz mal.
Não tente correr atrás da felicidade, nuns dias você estará feliz e nos outros não.
Eu sei voar, mas prometa que não vai contar para ninguém. Se quiser, eu te ensino.
Podemos contar nos dedos as pessoas que são felizes neste mundo.
Todos os seus vizinhos felizes vão acender as luzes das janelas do prédio uma a uma.
Veja que a maioria já se apagou.
Restam apenas cinco.
Muitas vezes tudo o que as pessoas querem é um dia comum.
Vamos tomar um café e transformar o amanhã em hoje?
A vida não é boa por ser bonita, mas porque de alguma forma ela sempre continua.

Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp

Respostas de 2

  1. Muito boa sua crônica/poema amigo!!!
    Certamente verei este filme!
    A vida é feita de momentos, muitos mágicos, como quando VC viu este filme inspirador!
    Forte abraço!!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Foto: Gustavo Noronha

Leandro Alves
Muito prazer!

Mineiro, de Belo Horizonte, cronista, formado em Letras pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, a PUC Minas.  Comecei a escrever crônicas postadas nas minhas redes sociais, muita gente gostou e eu continuei. Atualmente, cronista do jornal Porta Voz de Venda Nova. O jornal é impresso, mas esporadicamente também é distribuído online.

Participei do livro “Escrevendo com as emoções”, editora Leonella, sob a curadoria da escritora Márcia Denser.  De 2015 até maio de 2023, participei do Estúdio de Criação Literária, nos formatos presencial e online.

Depois de ler “O padeiro”, crônica de Rubem Braga, e “Flerte”, de Carlinhos de Oliveira, decidi que o que mais desejo fazer nada vida é ser cronista.

Acredito que todos nós, sem exceção, todo dia que saímos de casa, queiramos nós ou não, participamos de um grande filme mudo chamado vida e que tem sempre alguém bisbilhotando tudo o que a gente faz e falando da gente pelas costas. Neste caso, alguns são como eu e escrevem crônicas.  Muito prazer!

Curadoria Márcia Denser