O blog do Leandro Alves

As pessoas são todas umas bisbilhoteiras.  Falam dos vizinhos, falam dos amigos pelas costas, espiam a vida dos outros.  O jornaleiro, o dono da padaria, o cobrador do ônibus, o marido da vizinha, o professor do colégio — ninguém escapa deste prazer humano de falar da vida dos outros.  Pode ser falar bem, mas também falar mal. Algumas pessoas são como eu, transformam tudo em crônicas.

Leandro Alves

Tatuagens

 

 

 

Tatuagens

Leandro Alves

Ela era casada e feliz com marido e filho. A mãe, dona de uma padaria no bairro onde ela e o marido trabalhavam, além dos irmãos, ainda a tratava como se ela ainda fosse pequena.

Parece clichê, mas para a mãe os filhos são sempre crianças.

Era ela assumir o trabalho de operadora de caixa a mãe perguntava se ela trouxe blusa de frio, se havia dormido tarde, se esquecera de almoçar. Mesmo que a filha já fosse casada e mãe.

Um dia descobriu que várias de suas amigas fizeram tatuagem. Cada tatuagem um significado, uma história para contar, um caso. Com nome de filho, com nome do marido, das mais inocentes, das mais discretas.

“Eu sempre tive vontade de fazer uma tatuagem”, falou a operadora de caixa para uma amiga antiga do colégio quando ia pagar o pão quentinho de manhã.

“Se você fizer uma tatuagem no seu corpo, não precisa nem me chamar de mãe”, nada que as mães sejam capazes de fazer melhor do que uma boa chantagem sentimental. A moça engoliu em seco, prometeu obedecer, não questionou.

O curioso é que para o marido estava tudo certo para que ela fizesse uma tatuagem, com a mãe não. Diante da mãe, ela ainda se sentia uma menina de mochila nas costas indo para o colégio.

Até que um dia a mãe chegou na padaria, viu que a filha trabalhava no caixa com uma blusa de frio longa, cobrindo o pescoço. Foi falando logo: “Deixa eu ver isso aqui.” E viu. Uma tatuagem bem na altura do pescoço. Quando levantou o braço para esbofetear a filha, viu que na tatuagem estava escrito “Amor de mãe”. Choraram, se abraçaram, lembraram do passado.

Claro, aquela tatuagem abria espaço para outras mais discretas. Bem que as amigas prometeram dar um jeito para que ela fizesse uma tatuagem. E deram. Nada melhor que um grupo de mulheres pensando juntas para achar uma solução.

Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp

Respostas de 2

  1. Que história interessante!!!
    Também já quiz fazer tatuagem mas, até hoje não fiz…
    Legal que essa moça ganhou o carrinho da mãe.
    Obrigado pela crônica amigo!!!!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Foto: Gustavo Noronha

Leandro Alves
Muito prazer!

Mineiro, de Belo Horizonte, cronista, formado em Letras pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, a PUC Minas.  Comecei a escrever crônicas postadas nas minhas redes sociais, muita gente gostou e eu continuei. Atualmente, cronista do jornal Porta Voz de Venda Nova. O jornal é impresso, mas esporadicamente também é distribuído online.

Participei do livro “Escrevendo com as emoções”, editora Leonella, sob a curadoria da escritora Márcia Denser.  De 2015 até maio de 2023, participei do Estúdio de Criação Literária, nos formatos presencial e online.

Depois de ler “O padeiro”, crônica de Rubem Braga, e “Flerte”, de Carlinhos de Oliveira, decidi que o que mais desejo fazer nada vida é ser cronista.

Acredito que todos nós, sem exceção, todo dia que saímos de casa, queiramos nós ou não, participamos de um grande filme mudo chamado vida e que tem sempre alguém bisbilhotando tudo o que a gente faz e falando da gente pelas costas. Neste caso, alguns são como eu e escrevem crônicas.  Muito prazer!

Curadoria Márcia Denser