Uma crônica de Leandro Alves
Vontade que nos deixa desesperados
Não sei quanto a vocês, mas acho que prazer nenhum neste mundo se compara ao prazer de fazer xixi. O prazer do sexo, da comida, de viajar, de beber com os amigos. Tudo isso é pequeno diante do prazer de encontrar um banheiro, depois de ter passado horas procurando. Essa vontade toma nosso pensamento todinho, não deixa a gente pensar em mais nada e nos priva da imaginação, de tudo. Sei que muita gente acha que o assunto é fútil demais para caber na literatura, mas o que posso fazer com este meu vício de cronista?
Pode ser uma aventura, a de procurar por um banheiro nos momentos mais inconvenientes.
Quando vejo um lugar como muita gente reunida, ao vivo ou na televisão, fico pensando sempre a mesma coisa. Se der vontade ali na hora, o que a pessoa vai fazer? A noiva na hora de dizer sim ao noivo no altar, uma multidão se espremendo num show de rock na praia, um grupo seguindo um bloco de carnaval por aí, uma passagem de ano, um comício político, uma passeata política, uma briga de trânsito, um engarrafamento.
Situação das mais esmagadoras é a dos shoppings centers, quando cobram para usar o banheiro. Bom, é mais ou menos assim. Você vai ao segundo piso do shopping, vai caminhando em passos trôpegos para o banheiro, como se estivesse bêbado. Chegando lá, descobre que só pode pagar pelo banheiro no sistema de pagamento de cartão de crédito — que você acaba de descobrir estar estragado. A atendente lhe informa que tinha fichas até uma hora atrás, mas acabaram. A colega dela tem mais fichas, no piso de cima.
Lá vai você, subir e descer escada rolante, de pernas bambas, à procura de uma ficha para ir ao banheiro. Quando consegue, descobre que só pode usar o banheiro do piso debaixo. Quando finalmente consegue se aliviar, o prazer é indescritível.
Interessante mesmo é entrar num carro ou num ônibus, enfrentar um engarrafamento, lembrar que tem um teatro aberto, com bebedouro e banheiro de graça. Quando chega ao teatro, a faxineira está limpando. Quando te vê ela diz: “Oh, tadinho. Quer entrar? Homem não pode prender assim muito tempo não. Pode entrar, viu. Eu espero.” Você entra. Acaba de se aliviar. Sai com uma felicidade no rosto. Abraça a faxineira e lasca um beijo na bochecha dela. “Obrigado, viu”. “De nada, meu bem”. Quando olha para a colega de trabalho dela, fala assim: “Tadinho”.
Ao sair, você vasculha o bolso e lembra dos números que vai jogar na Mega-Sena. Confere os números, percebe que é isso mesmo, caminha tranquilo até achar uma casa lotérica mais próxima, respira fundo, anda devagar. Só depois de se aliviar, você lembra que sempre sonhou em ficar rico. O prêmio da Mega-Sena sempre fica em segundo lugar.